25/07/2012

Relações Amorosas II

Certa vez, o cartunista Miguel Paiva publicou um desenho sob o título de O amor é cego, mas não é eterno, onde se via um homem atirando fora seus óculos escuros e sua bengala branca enquanto saltava e gritava, em italiano: “miracolo, miracolo!”. O uso da palavra milagre na língua de Dante, nos remete à tragédia de Romeu e Julieta. O cartoon do Miguel trás à mente a dolorosa história dos ingênuos jovens que se deixam embalar pelas delícias de uma paixão adolescente e acabam, por força das armadilhas do destino, vítimas de uma cruel morte dupla. Para os espectadores da peça de Shakespeare fica a emoção de testemunhar a tragédia que tão facilmente poderia ter sido evitada e o sentimento de que em circunstâncias favoráveis o casal poderia ter levado avante seu romance e até teriam a possibilidade de serem felizes para sempre, como em todo bom conto de fadas. Pena que a vida não seja propriamente um conto de fadas e que o final feliz não caia do céu com tanta facilidade assim. Paixões adolescentes são próprias de adolescentes e – apesar da dramaticidade de seu início – costumam se esgotar aos poucos, terminando de maneira chocha, como na descrição de T. S. Elliot: “não com uma explosão, mas com um gemido”. Quando não viram tragédia – o que felizmente raras vezes acontece – acabam em chanchadas próprias da falta de prudência da idade. Perigosas mesmo são tais paixões quando vividas por pessoas mais velhas e que já têm tempo de vida bastante para serem mais ajuizadas. Nada contra os adultos que se deixam embalar pela sedução do encontro de um novo amor. Porque não curtir o enlevo da descoberta de um parceiro adequado, principalmente depois de haverem vivido dolorosas desilusões? Preocupante é quando vemos uma mulher, já na maturidade, mobilizada pela frustração de uma vida profissional sem realização, atribui a culpa pelos seus fracassos à falta de graça de seu marido e, ao encontrar na esquina um Romeu disponível, se dispõe a acreditar que ele será o catalisador de sua felicidade. Baseada em uma crença assim, com a proverbial valentia feminina, ela se disporá a destruir seu casamento em busca de um futuro tão ilusório quanto um castelo de areia, porque alicerçado na expectativa de que o outro virá, como um príncipe encantado, trazendo o milagre da realização pessoal sem o necessário embasamento. Da mesma forma, muitas vezes um homem - também na maturidade - insatisfeito com sua vida profissional, tenta a compensação das conquistas amorosas como forma de recuperar a autoestima abalada pela falta de realização pessoal. Quando, em sua busca pelo consolo no sexo, ele se depara com uma Julieta ensandecida pelo ardor adolescente fora de hora, embarca na mesma canoa na esperança de que uma aventura amorosa temperada pela paixão o compense de suas frustrações e de seus fracassos. Ai está um amor que tem tudo para dar errado. E vai dar. Por vezes demora bastante para se extinguir o fogo da paixão e o casal vive momentos de plenitude amorosa. Mas a realidade das dificuldades da vida bate à porta e as agruras do quotidiano terminam por solapar esta relação mal construída. Pior ainda quando, por mera vaidade, eles não querem dar o braço a torcer aos seus críticos (que sempre existem) e mantém, por um longo período, a farsa em que se tornou a relação. Uma relação amorosa, para fazer o trânsito da paixão para o amor, necessita de um sólido alicerce baseado em motivações sadias e na maturidade do casal. Somente quando o crivo da razão avaliza o momento de emoção temos a possibilidade de um final realmente feliz.

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